segunda-feira, 7 de novembro de 2016

À CONVERSA COM MANUELA DE SOUSA


Conheci a Manuela de Sousa em Macau, nos finais do anos 1980. Eu era Coordenador do Gabinete do Complexo Cultural de Macau e ela dava aulas de joalharia na Academia de Artes Visuais. Cedo as nossas famílias frequentavam-se mutuamente, as crianças brincavam juntas e eu apercebi-me das coisas belíssimas que a Manuela fazia. Nessa altura era ela a única em Macau formada em joalharia e depois de muito ver, de a ouvir falar com aquela ingenuidade e integridade que sempre nela conheci, entendi que ela merecia a consagração em Macau, não apenas dela, mas também da arte da joalharia, que até ali tinha sido coisa para as lojas de jóias em ouro e brilhantes. Acho que a exposição na Galeria do Leal Senado foi a sua consagração em Macau e, também a perceção de que a joalharia deveria ter um estatuto que até então não tinha.
A minha recente visita a Lisboa proporcionou um reencontro e uma conversa que ficou agendada para este espaço.



alfinetes em prata 


A.C.J. - Manela, como surgiu a joalharia na tua vida? 
M.S. - Sempre pensei em fazer escultura, mas no ano em que comecei no Ar. Co, o curso de escultura não aceitava mais alunos e decidi não ficar à espera e inscrevi-me em Joalharia.
O tempo foi passando e acabei por ficar.

A.C.J. - Naquela altura a AR.CO do Manuel Costa Cabral tinha muita pujança? Quando começaste a expôr? Foi difícil?
M.S. - Sim, o surgimento do Ar.Co em 1973 foi muito importante  no panorama do ensino artístico em Portugal, como escola independente e aberta à experimentação. 
Em 1978 foi criado o Departamento de Joalharia do Ar. Co, pelas joalheiras Alexandra Serpa Pimentel e Tereza Seabra e à semelhança dos outros departamentos e também do que já se fazia em vários países da Europa, o ensino de joalharia tornou-se mais experimental e abriu novos caminhos no panorama da joalharia em Portugal.
Macau foi muito importante para mim em termos pessoais e profissionais. Tive a oportunidade de criar a primeira oficina  e os primeiros cursos de joalharia no território, na Escola de Artes Visuais que então pertencia ao Instituto Cultural de Macau passando mais tarde para o Instituto Politécnico de Macau.
Foi em Macau que realizei as minhas primeiras exposições individuais, tendo sido a do Leal Senado por teu convite.
Quando regressei a Portugal continuei a expor regularmente quer em Portugal quer noutros países da Europa e também nos Estados Unidos da América.

A.C.J. - Em termos de público, em Portugal, achas que já se conseguiu uma aceitação da joalharia sem ser como arte menor, coisa que sempre me fez confusão? 
M.S. - Em Portugal a Joalharia Contemporânea tem cada vez uma maior visibilidade, tendo para isso contribuído a abertura de galerias, a realização de exposições, conferências, workshops e através do intercâmbio entre artistas nacionais e estrangeiros.
Em Setembro de 2004 foi criada a PIN,  Associação Portuguesa de Joalharia Contemporânea, tendo eu feito parte da sua direção. Esta associação tem tido um papel muito importante na divulgação da Joalharia Contemporânea. 
A Joalharia Contemporânea ou Joalharia de Autor já está a outro nível de entendimento que não o de uma arte menor, mas esta questão ainda não se encontra bem definida, havendo uma diluição nas fronteiras entre a Joalharia Contemporânea e as outras formas artísticas.

A.C.J. - Entre as artes do fogo, a cerâmica e a joalharia sempre me atraíram muito. Sei que neste momento te especializaste numa verdadeira alquimia da jóia. Por favor elabora.
M.S. - A arte de trabalhar o metal (ourivesaria), tem muito de alquimia. .
Ao falar contigo sobre a forma como  crio as minhas peças, apercebi-me que neste processo de criação há  uma pesquisa e experimentação permanente, no sentido de materializar a minha ideia criativa. A vontade de aplicar a cor no meu trabalho levou-me desde há algum tempo a dedicar-me à aprendizagem de técnicas de coloração. 

A.C.J. - Para quando uma página nas redes sociais para vendas ao público, única forma de partilha dada a um artista? E uma exposição em Macau? 
M.S. - Tenho oferecido alguma resistência às redes sociais, mesmo que seja para divulgar ou vender o meu trabalho, não me vejo ainda agora nesse registo.
Mas tenho o meu trabalho em galerias e em sites dedicados à divulgação da joalharia.
Gostaria muito de voltar a expor em Macau.