Popularidade é o primo distante do
prestígio.
Alejandro Iñarruti
E a sétima arte encerrou a sua 87a.
edição, nos princípios do Ano da Cabra, premiando Birdman. Como tudo na vida, é uma escolha, mas uma escolha baseada
numa opção que é a de que, em cinema, a principal regra é não ter regra. Isto
é, a que melhor se adequa ao que se deseja registar.
Recordo-me como, nos meus tempos de
estudante, seria impossível congeminar o tempo futuro e as tecnologias que a
ele hoje presidem. Todos os vaticínios falharam.
Nesse tempo, ainda não se tinham
inventado os pixels e a cassete áudio começava a sua incursão no mundo da
música, competindo com os long plays e EPs de vinil.
Curiosamente, de volta ao filme
premiado, este é da autoria de um latino, o mexicano Alejandro González
Iñarritu, autor de outros títulos, entre os quais 21 gramas e Babel.
O interesse desta história (Birdman)
não está meramente na decadência que o tempo traz aos heróis, verdadeiros ou
fictícios. O filme transpira um olhar sobre si próprio e algumas das
contradições ou perversidades que ele contém no que respeita não ao tempo do
fotograma, mas àquele outro que atravessa os homens, transformando-os em
outros, sombras ou amplificações do que foram.
É admissível aqui que o narcisismo
persista, decrépito, no lodo do tempo e dos ritos que conduzem aos mais
diversos conflitos inspirados pela solitária nostalgia de Michael Keaton,
outrora super-herói, cuja memória lhe obscurece o tempo real e dá o mote à
narrativa.
Do mesmo modo, e tomando o filme por
paralelo, as cidades e os seres que as habitam tornam-se pólos de conflito
quando o tempo atravessa o seu inusitado e desmedido crescimento.
Essa desmesura, quando ocorre, faz
emergir não a virtude da ignorância,
mas antes a sua condição e essência, isto é, não se saber que não se sabe.
É uma circunstância em tudo idêntica à
edificação de uma metáfora do inferno, quando este significa a ausência da
divindade que confere o conhecimento. Aí, então, tudo decai e se mumifica, imutável
numa desmedida busca inconsequente do sentido das coisas, que apenas existem na
imaginação que lhes procura dar forma, imaginação alimentada pela ausência de
saber e conhecimento, porém nutrida por uma ilusão de felicidade.
Assim nasce a fantasia, entre o
absurdo, o patético e o horrendo, fachadas e cenários de vidas despidas de
outro sentido que não seja o da mais pura vocação materialista.
Esta a origem de toda a indiferença
face a quaisquer outros cenários, que não os do lucro, num guião por demais
conhecido.
Sucede porém que, nesta desesperança
para a maioria dos figurantes desta longuíssima metragem chamada Macau, emerge
um personagem de nome Alexis, homónimo de um outro, mediterrânico, que rasgando
a tela transmuta o filme em realidade, luzes da sala acesas, e no dia primeiro
do Ano Novo da Cabra veio dizer ao público que havia figurantes excessivos,
afogando o guião desta nossa realidade, e que, assim sendo, era necessário
resgatar a cidade e devolvê-la aos cidadãos.
Os trabalhos que esperam o nosso Alexis
são tão hercúleos quanto os do grego, diferindo apenas nos orçamentos.
Perante os desideratos de Alexis Tam,
do seu pelouro e do cruzamento com outros, espera a população que se tomem por
padrões os internacionais, em tudo. Melhor dizendo, na Educação, na Cultura, na
Saúde, nos Transportes, na Segurança, na Habitação, numa Economia saudável,
eliminando os filmes de terror.
A
ajuizar pelas acções já desenvolvidas, como a velocidade com que já se
encontram em fase de contratação de meio milhar de médicos para a saúde e
outros trabalhos, acabo por admitir seriamente que, a este saudável ritmo,
Macau poderá em 2020 ganhar o Óscar da melhor realização por ser, finalmente,
um qualificado Centro Mundial de Turismo e Lazer, e para o Secretário para os Assuntos
Sociais e Cultura a distinção de melhor realizador.
O Alexis, que já conheço há muitos anos (fomos vizinhos e a minha filha mais nova deve o nome, Mariana, ao de uma das filhas dele) é um tipo dinâmico, com fortes convicções, com Mundo e com capacidade de trabalho.
ResponderEliminarVai apanhar muitas pedras no caminho.
Espero que tenha a capacidade de, também ele, com elas construir um castelo.
Todo aquele que demonstra e comunica merece o nosso aplauro e apoio. Venha o castelo
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