Viemos de um outro tempo em que o que nos era mais caro
era a sinceridade. Inocência dos tempos da juventude e, possivelmente, de muita
ingenuidade. Vivíamos um tempo que a si mesmo se dava generosamente mais.
Tal como agora, havia acácias, árvores de polpudas flores
de cor de romã que se estatelavam no chão, soltando fibras que semelhavam
algodão, pairando no ar. Projectavam sombras frondosas enquanto os triciclos
nos traziam frescas brisas e a barraca de pesca permanecia na meia-laranja.
No ar pairavam aromas tantos, misturas indiscerníveis,
metáforas do que são os macaenses, nação de singularidades, de indivíduos
multilingues que por aqui permanecem ou pelo mundo se espalharam em diáspora.
Há trinta ou mais anos, disse que o que fazia a diferença
em Macau do resto da China era a existência de uma comunidade que tinha
conseguido, pela genética, legitimar a fugaz presença portuguesa,
configurando-se, ela sim, como embaixadora, usufrutuária e portadora da
Portugalidade.
Saltando o desfiladeiro das décadas, é grato constatar
que desde a Transição, a República Popular da China encontra em Macau a mais
adequada plataforma para a relação com os Países Lusófonos.
Macau sempre foi, de forma inexplicável, um sortilégio
que por aqui nutriu as raízes, não apenas de tantos portugueses aqui radicados ad aeternum, como de chineses que por
aqui se instalaram, provenientes de províncias diversas.
A nós, portugueses e luso-macaenses, é-nos requerido que
saibamos encontrar e emanar a essência da singularidade, para que o aroma se
transmute em perfume singular para o Lótus de Macau.
A cada um de nós, de origem vária, diversa e dispersa,
cumpre-nos ser a diferença. Que fiquem para trás os tiques de outros mundos que
a este não pertencem. Que nos afirmemos pela qualidade, pela natural capacidade
de nos misturarmos, em vez de nos atermos a refúgios de círculos fechados.
Macau é, deve ser, sobretudo, um espaço para relações
singulares, sempre pronto ao reatamento.
A idade tem destas coisas, potencia o tempo distante e
traz a cada reencontro a certeza de que, aos Amigos de verdade, Macau nunca
lhes é indiferente.
À medida que o tempo passa, os aromas ou se apuram ou se decompõem.
Uma reflexão que os jovens macaenses que agora se encontram reunidos em Macau deveriam ler com atenção.
ResponderEliminarPara depois viver.