Em boa hora vem o Professor Augusto Mateus a Macau, a
convite do Albergue SCM, para um Seminário sobre as Indústrias Criativas, no
quadro de uma plataforma estratégica nas relações económicas entre a China, a
União Europeia e os Países de Língua Portuguesa.
Seria bom que o Seminário fosse integralmente traduzido
para o chinês, e que exista suficiente público com maturidade para ouvir, fruir
e reflectir.
As Indústrias Criativas são, por natureza e definição,
actividades de natureza eminentemente Económica!
O facto de se poderem intersectar com actividades de
cariz criativo não faz delas, apenas, indústrias para “recuerdos” e o mais que
por aí anda.
Quando me falam de indústrias criativas, as minhas
referências vão para grandes conglomerados como a Zara e a Zara Casa ou a
Giorgio Armani, Emporio Armani, AX e Armani Casa, ou para as indústrias da
inovação como a Samsung, a Apple, a Sony e tantas outras.
Numa recente leitura de um artigo, que noticiava o novo
carro eléctrico da Tesla (sem dúvida
assim nomeada em homenagem a Nikola Tesla), tomei conhecimento do quanto a
Apple está interessada no veículo, a ponto de oferecer aumentos de 60% para
cativar engenheiros da Tesla a transferirem-se para a base da Apple em
Cupertino, na Califórnia.
O TESLA S
A Apple não precisa de apresentação, apenas relembro que
depois de ter criado o Macintosh, o iMac, o iPhone, o iPad, o Apple Watch, o
potencial iCycle, o passo seguinte será um carro eléctrico, amigo do ambiente,
a próxima cereja no topo do bolo Apple.
Noutros firmamentos, as consolas de jogos, como a PS4 ou
a XBOXONE, disputam mercados, enquanto, anualmente, a engenharia electrónica
dos telemóveis, câmaras digitais e um sem número de gadgets e apps invadem o
mercado, após sujeitas ao necessário design, este apenas parte do todo.
A grande questão em Macau é que o meio criativo, além de
ser pequeno, parece desconhecer a articulação da criatividade com outras
especialidades e dos reais objectivos e escalas das Indústrias Criativas.
A escassas 40 milhas, Hong Kong é um dos grandes
produtores mundiais de filmes. Articula as suas produções com Hollywood. A
vizinha Região Administrativa Especial tem marcas, como a Shanghai Tang,
Baleno, Bossini, Giordano, Crocodile Garments, G2000, Esprit, Joyce Boutique,
entre outras . E nós?
Nós vivemos no planeta do wishful thinking, do pequeno projecto de cada um, sonhando
legitimamente com a lua e o universo. Há em Macau um hábito muito antigo: o
desaproveitamento de talentos, por não se saber dirigir, gerir, potenciar.
Macau não tem disseminado uma elite pensante em várias
línguas. Macau debate-se com falta de “talentos”, que nunca existirão enquanto
se mantiver a postura de dificultar a entrada de mais valias. Sem quadros
capazes, não há boas intenções que valham.
Perdoe-se-me a nota pessoal, mas em 1995 propus, ao
Governo de então, que fosse lançada uma estrutura, a que chamei de Centro de
Criatividade, onde pudessem convergir, vindos de todo o lado, cérebros que
construíssem um centro de inteligência que pudesse pensar sobre estes assuntos,
num momento que as indústrias criativas não eram ainda assim chamadas. As malhas
de então fizeram o assunto cair no olvido.
Poder-se-á argumentar que Macau tem uma identidade muito
própria e que, por tal, haveria que utilizar essa marca nos produtos aqui
gerados. Não vou discutir esta premissa, apenas dizer que há uns anos a
Universidade de São José estava a trabalhar com a China em veículos eléctricos.
Desconheço o actual estado deste
projecto. A pergunta é: em que é que isso e outras coisas têm a ver com hibridez
cultural?
Tomando o Reino Unido como referência, e as exportações
como objectivo, as Indústrias Criativas geram anualmente naquele país 76.9 mil
milhões de libras, qualquer coisa como MOP1,194,180,000,000!!! Não admira, pois,
que a R.P. da China fale de diversificação económica para Macau. Não está a
falar em objectos “Love Macau” , está a falar em economia criativa. O Centro de
Referência de tecnologia da UM e o de Medicina Chinesa em Henqin poderão vir a
constituir caminhos.
Pode parecer que estou a ser crítico em demasia. Darei a
mão à palmatória quando vir Indústrias Criativas em Macau a constituírem uma
alternativa económica à indústria do jogo que, em 2014, caiu para 44.1 mil
milhões de patacas.
Os assuntos respeitantes à cidade, no seu conjunto, são
interactivos, fazem parte de um todo. Falo a um plano ético e moral. Aí, a
cidade constituir-se-ia num aglomerado funcional e verdadeiramente cosmopolita,
despojada de pensamentos xenófobos que liquidam, à nascença, qualquer
possibilidade séria de desenvolvimento.
Não é, assim, despiciendo lembrar que os Estados Unidos
se fizeram com imigrantes, e que as grandes cabeças que lá vivem foram atraídas
pelos grandes conglomerados, pelas grandes universidades.
Steve Jobs era descendente de sírios e alemães. O Nobel
da Química de 2015, Aziz Sancar, nasceu na Turquia. O Nobel da Medicina 2015,
William C. Campbell, nasceu na Irlanda. O Nobel da Física 2014, Shuji Nakamura,
nasceu no Japão, e os exemplos e listas continuam, intermináveis.
Assim, enquanto houver quem aposte na discriminação,
enquanto não houver grandeza de espírito para abertura ao mundo, a cidade está
condenada a ser aquilo a que os chineses chamam, muito justamente, de
"sapo no fundo do poço, olha o redondo do céu e pensa que é o
universo". Não me parece que seja nada disto que a poder central da China
deseja quando lança a orientação da diversificação da economia.
No que respeita à arquitectura, numa cidade onde uma das
principais actividades é o imobiliário, o que se assiste, em muitos casos, é à
construção baratinha, com pastilha na parede. Uma cidade não pode viver da
especulação.
Estas são preocupações de cidadão, iguais às de muitos
outros.
É o desenvolvimento do colectivo, da qualificação da
cidade enquanto um todo habitado e habitável, que me impele à defesa da
cidadania plena, da qualidade e critérios, que só podem existir quando se
compreender, por via da cultura, que a economia tem de ser encarada como força
criativa e não especulativa.
"Pode parecer que estou a ser crítico em demasia. Darei a mão à palmatória quando vir Indústrias Criativas em Macau a constituírem uma alternativa económica à indústria do jogo que, em 2014, caiu para 44.1 mil milhões de patacas."
ResponderEliminarEu chamo-lhe realista.
Gostava de achar que estava a ser céptico.
Mas a realidade está aí.
Há algumas pessoas que não deixam cair o tema.
Mas são poucas, são bem conhecidas, não podem lutar contra moinhos de vento.
Aquele abraço, boa semana
Obrigado meu caro. Bem haja. Abraço
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